O cavaquinho - esculpido em pedra Foto: Gabriela Castilho / Lupa Cultural |
Entre papel cartão e pedra, tudo
vira arte nas mãos de Nelson Cardoso. Brasileiro, porém português de coração, o
artista plástico e escultor nasceu e cresceu em Ribeirão Preto (SP), e, aos 21
anos, partiu numa viagem para Portugal. O que era para ser apenas um passeio
de três meses resultou em uma formação de três anos em escultura pelo AR.CO,
Centro de Arte e Comunicação Visual de Lisboa. A partir daí, participou de
exposições individuais e coletivas que estão espalhadas em galerias de Portugal,
Alemanha e França. Em 1988, representou Portugal no simpósio “Iwate-Machi Stone Sculpture Symposium”, no Japão. O mais
curioso é que a sua terra natal pouco conhece de seu trabalho. Alguns dos
poucos apreciadores brasileiros que tem são os que vivem na Europa.
Há três anos, tive a oportunidade de visitar
Cardoso em sua casa, em Sintra (Portugal), para um almoço. A impressão que tive
foi de uma pessoa simples. Exótico em todo o seu conhecimento de arte, mas humilde
e absolutamente gentil. Com seu cabelo cacheado pouco arrumado, ele anda com
camisa e calça surradas e chinelos pela sala. O que em primeiro contato pode
parecer desleixo, após alguns minutos de conversa se transforma em
tranquilidade e despreocupação.
Cada cômodo da casa, que Nelson
divide com seus cachorros, é alegre, cheio de cores vindas das próprias obras e
receptivo, assim como o artista. A sala e os quartos acomodam
bonecos, quadros e máscaras de antigas exposições, enquanto a varanda é rica em
esculturas em pedras. Restos de materiais e obras começadas se acumulam onde
houver espaço na casa interminável, cheia de portas para explorar e uma varanda
extensa, onde acomoda mais de suas esculturas.
Sala de Nelson Cardoso com vários de seus trabalhos Foto: Gabriela Castilho / Lupa Cultural |
Nelson passa noites em claro
trabalhando em suas obras e vai para a cama pouco antes do sol nascer. Trabalha
quando quer, quando surge inspiração. Então, depois do meio-dia ele se levanta
e espera o almoço ficar pronto tomando vinho tinto e fumando cigarro de palha,
enquanto Cássia Eller canta seus antigos sucessos no rádio.
Em pedras, Nelson esculpe desde
anjos e bailarinas seminus a cavaquinho e vasos de flor. Com cartão e papelão
reciclados, ele monta cenas metropolitanas que exprimem sua visão das terras
brasileiras. “Se você andar em são Paulo, vai encontrar muita figura deitada na
rua e policial fazendo ronda. Por isso gosto de ir para o Brasil, eu tenho mais
ideias”, relembra o artista com certa nostalgia. Já os quadros, que exibem um
pouco mais de humor e nudismo, são montados com material reciclável e, às vezes,
madeira, também usada na elaboração de máscaras.
Como disse no início, tudo em sua
mão vira arte. Quando o questiono sobre tanta criatividade, Nelson toma um gole
de seu vinho tinto e, sem pressa, explica que “a vida muda e as minhas
inspirações mudam também”. Para ele, cada material tem um sentimento diferente
e, então, o trata e trabalha de acordo.
Nexus, Sexus e Plexus, da trilogia de Henry Miller Foto: Gabriela Castilho / Lupa Cultural |
Os trabalhos mistos de madeira e
cartões reciclados são sobreposições que, assim como as pedras, exigem
criatividade: “O reciclado me dá mais liberdade: é tudo peça que eu encontro e
vou montando como num quebra-cabeça.” Entre um gole da bebida e uma lenta
tragada no cigarro de palha, Nelson compara a criação dos trabalhos com desenho
feito à lápis em papel: “A gente vai apagando com a borracha até formar algo de
que a gente realmente goste.”
Conheça mais das obras do brasileiro- lusitano em sua página: Nelson Cardoso.